domingo, 24 de abril de 2011

O CORDEIRO E A GALINHA


Segundo a tradição bíblica, o primeiro casal saído das mãos de Deus, vivia nú pelo jardim do Éden e encontrava Deus pela manhã e a tarde. Eram revestidos da luz divina e não conheciam o pudor e a mácula.

Mas um dia, segundo o relato, perderam esta inocência e esconderam-se de Deus por que se viram nús. Deus os chamou pelo jardim e perguntou por que estavam escondidos. O casal então respondeu que estava com vergonha por estarem despidos.

Desde então a nudez passou a ser o grande imbróglio humano.

Mas era necessário vestir o casal a partir de agora. E como foram vestidos? Diz o texto que lhes foram feitos peles de cordeiro para servir de roupa. E dai se conclui que a primeira morte no mundo foi do cordeiro que doou a sua pele ao primeiro casal.

A morte então passou a ser o suprimento da necessidade humana. Muitos cordeiros foram necessários para vestirem os primeiros moradores da terra. Os animais foram inclusos no cardápio humano e a morte passou a ser o combustível para a vida.

Leio o conto " A galinha " de Clarice Lispector e me compadeço desse nobre ser. Uma galinha estava pronta para ser o almoço de domingo quando de repente ela corre em disparada entre muros e telhados dos vizinhos. A família corre atrás da galinha para garantir o almoço quando, em meio a fuga, ela põe um ovo no meio do caminho.

Aquele gesto de provisão, de doação e de vida, muda os planos da família e decidem não comer a galinha.

Torci para que ao final do conto ela pudesse ser esquecida e sobreviver. Mas não, acabou sendo comida.

A reflexão que faço neste domingo de Páscoa é que a morte é sempre um elemento provisional. Para cobrir a nudez humana foi necessário a morte. Para suprir a fome a morte quase sempre é o alimento.

Será a morte um dia debelada para a vida reinar suprema?

Livingston Streck

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