sábado, 24 de setembro de 2011

POR QUE ODIAMOS TANTO

Há uma distância muito grande daquilo que aprendemos como um ideal de sociabilidade, amor cristão, amor ao próximo e tolerância com aquilo que efetivamente vivemos. Se fizermos uma lista das pessoas que odiamos a nossa volta qual seria o tamanho desta lista? Começaríamos com pessoas da própria família, se estenderia pelos vizinhos, pelos colegas de trabalho, pelo chinês da pastelaria e quem sabe até na china teríamos um desafeto.

Cada um de nós não tolera alguém quer seja pelo que pensa, pelo que veste, pelo que diz ou simplesmente pelo “ não fomos com a cara.” E por quê? Por que somos tribais e porque sentimos a necessidade de pertencer a um grupo que nos fortalece e nos protege em face de outro grupo que repudiamos.

Este tribalismo hodiernamente se apresenta pelas torcidas de futebol que muitas vezes saem da rivalidade dos campos para as vias de fato chegando ao cúmulo de haver pessoas assassinadas por pertencerem a determinada torcida.

Outra manifestação desse sentimento tribal se dá através da proliferação de grupos religiosos e do grande número de igrejas que vemos espalhadas em to do lugar. Segundo pesquisa, há em torno de trinta e quatro mil religiões catalogadas no mundo todo. No meio desta proliferação de denominações é possível notar a grande contradição humana pois o cristianismo que essencialmente está fundamentado na pessoa de um só Pastor, se encontra fatiada ou fragmentada onde cada unidade se apodera e se auto denomina escolhida e detentora da verdade suprema. Compreensível? Creio que não.

Lembro da canção “ Imagine “ de John Lennon onde determinado parágrafo ele diz o seguinte:

Imagine there's no countries
It isn't hard to do
Nothing to kill or die for
And no religion too
Imagine all the people
Living life in peace


Imagine não existir países
Não é difícil de fazê-lo
Nada pelo que lutar ou morrer
E nenhuma religião também
Imagine todas as pessoas
Vivendo a vida em paz


Esta letra da canção não nos faz lembrar a Palestina onde seres humanos até hoje não tem um país para viver? Imagino, sem trocadilho, que John Lennon propôs uma sociedade justa e pacífica em sua canção.


Creio que os sistemas políticos e filosóficos que surgiram para dar um contorno ideal de uma sociedade igualitária, ruíram tal qual o socialismo proletário proposto por Karl Marx onde o mesmo elegeu o trabalhador como o ente principal dentro da sua filosofia.

Dos fragmentos da história restou o sistema capitalista que também não resolveu os problemas do mundo e ainda trás dentro dele, duas concepções responsáveis por sua ruína. A primeira concepção é o alto risco dos investimentos onde são criadas bolhas ou lastros fictícios capazes de arruinar países inteiros como aconteceu na Grécia e grande parte da Comunidade Européia e a segunda concepção é medir o homem somente pelo que ele tem. O sistema capitalista formou um novo homem que é julgado e aceito pelo que tem e não pelo que é.

Em conseqüência disto, este novo homem passou a buscar de todas as formas os bens que farão dele um ser socialmente aceito, independente dos meios que ele usará para tal fim. E vemos hoje o grande número de homicídios, latrocínios, roubos e furtos para que enfim, seja integrado a sociedade do ter.

Voltando ao título Por que odiamos tanto, ouvi de uma psicóloga certa vez que odiamos no outro aquilo que vemos em nós de pior. Escrevi neste mesmo blog um texto sobre a frase “ o inferno são os outros “ de Jean Paul Sartre onde ressaltei a idéia de que o olhar do outro é o grande revelador da nossa essência e por isso perturbadora. O outro vê o que não vejo ou não quero ver. Se o outro tem a capacidade de nos desnudar, o que realmente desejo que seja visto? Se Jean Paul Sartre nos condenou a ver no outro o inferno da para fazer de alguém o céu?

Concluo transcrevendo um relato emocionante sobre um grupo de atletas excepcionais que disputavam as Olimpíadas especiais de Seattle. Assim descreve o texto:


“ Há alguns anos atrás, nas Olimpíadas Especiais de Seattle, nove participantes, todos com deficiência mental ou física, alinharam-se para a largada da corrida dos 100 metros rasos

Ao sinal, todos partiram, não exatamente em disparada, mas com vontade de dar o melhor de si, terminar a corrida e ganhar.

Todos com exceção de um garoto , que tropeçou no asfalto, caiu rolando e começou a chorar.

Os outros oito ouviram o choro. Diminuíram o passo e olharam para trás. Então eles viraram e voltaram. Todos eles.

Uma das meninas, com Síndrome de Down, ajoelhou, deu um beijo no garoto e disse: “ Pronto, agora vai sarar.”

E todos os nove competidores deram os braços e andaram juntos até a linha de chegada.

O estádio inteiro levantou e os aplausos duraram muitos minutos. E as pessoas que estavam ali, naquele dia, continuam repetindo essa história até hoje.

Talvez os atletas fossem deficientes mentais... Mas, com certeza, não eram deficientes da sensibilidade... Por que? Porque, lá no fundo, todos nós sabemos que o que importa nesta vida é mais do que ganhar sozinho.

O que importa nesta vida é ajudar os outros a vencer, mesmo que isso signifique diminuir o passo e mudar de curso. “
Autor desconhecido

Será que um dia poderemos ver no outro alguém rigorosamente igual a nós tanto nos defeitos como nas qualidades? Que somos e seremos sempre substancialmente humanos? Que odiar o outro pode ser o ódio a si mesmo? Que possamos diminuir a lista de desafetos e incluí-los mais em nosso coração.

Livingston Streck

sábado, 17 de setembro de 2011

O NÚ COLETIVO E O PERDÃO

Spencer Tunick é o fotógrafo americano especializado em fotografar multidões peladas pelo mundo afora. Já esteve no Brasil fotografando e tirando a roupa de milhares de paulistanos no parque do Ibirapuera. Segundo o portal UOL, 17/09, Spencer Tunick acaba de fotografar mais de mil israelenses a beira do mar morto em Israel.

No Brasil, se determinada pessoa tirar a roupa em público, estará cometendo um crime penal de constrangimento. Se um fotógrafo qualquer ou o próprio Spencer desejar fotografar milhares de pessoas nuas aqui no Brasil, estarão fazendo arte e não atentado ao pudor.

Faço esta reflexão baseado nas últimas aspirações coletivas que ocorreu aqui em São Paulo sendo a primeira delas a marcha da maconha. A lei penal trata a maconha como uma substância psicoativa entorpecente, portanto de uso proibido em território nacional. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal, guardião máximo da nossa Constituição, autorizou a chamada “ marcha da maconha “ em nome da liberdade de expressão que não deve ser coibida por ser um principio pétreo.

Como não podemos esperar da esfera humana decisões perfeitas e certeiras, achei esta decisão dos ministros que votaram a favor da liberdade no caso específico um tanto esdrúxula e incoerente. Proibir o uso de tal substância mas promover a liberdade de fazer apologia do mesmo beira o irracional.

Afim de entender o porque do mesmo ato ser punível quando praticado isoladamente e quando se estende ao coletivo recebe outras qualificações, penso na força coletiva capaz de mudar paradigmas. Se pensarmos que a bem pouco tempo atrás achariamos inimaginável duas pessoas do mesmo sexo receberem do estado a autorização para se casarem, hoje pode se dizer que é uma realidade incontestável. E só é possível tais mudanças diante da força do coletivo que se impõe perante o estado e a sociedade.

Penso e espero que um dia esta força coletiva poderosa que derruba conceitos e muda uma cultura de um país, possa enfim lutar para mudar aquilo que mais lhe degrada que são os seus representantes políticos que usurpam e roubam da sociedade os tributos que são pagos, a confiança num sistema representativo que pouco o representa, a pobreza e a miséria que são mantidas para garantia perpétua de gerações e gerações de políticos que se sucedem sempre com o mesmo objetivo.

Que não só a maconha ou os direitos dos homossexuais sejam alvo de passeatas e lutas coletivas mas também o direito de termos representantes honestos que não nos roubem ou que roubem pouco pois esperar do homem honestidade e integridade pode ser fantasioso demais.

O país está enterrado na lama da corrupção. Estamos votando e pagando para políticos roubarem o dinheiro que é de todos. É como se convidassemos um desses políticos para irem a nossa casa e lá surrupiassem nossos bens sem que o víssemos. Assim está sendo feito por muitos que longe do nosso olhar roubam dinheiro da saúde, da segurança e da educação.

Se essa roubalheira se tornar coletiva será a vitória do nú. Um homem nú é um crime mas uma coletividade nua é arte, portanto não permitamos que a roubalheira vire arte em nosso país.

Livingston Streck