domingo, 30 de janeiro de 2011

O GRITO DE HABACUQUE


Quando vemos o mundo se esfacelando em terror e violência, quando a natureza despeja sua fúria e destrói milhares de pessoas, surge uma pergunta básica diante da estupefação humana. Onde está Deus?

Um profeta-filósofo bíblico chamado Habacuque também proferiu esta mesma pergunta mas de forma bem mais ousada. Bradou ele o seguinte: " Até quando clamarei, e não escutarás, Senhor? Ou gritarei a ti: Violência! E não salvarás? " Habacuque 1: 2

É como se hoje gritassemos a Deus cobrando-o de tanta violência, miséria e fome no mundo.

Habacuque, diante da opressão do povo de Judá, não entendeu por que Deus permitiu que um povo escolhido por ele agisse com tanta opressão e injustiça em relação ao seu povo.

Deus então não deixou o ousado profeta sem resposta. Disse a ele que os Caldeus, considerado à epoca um povo bárbaro e feroz, que com sua permissão, iria destruir o povo de Judá e toda a sua injustiça.

Habacuque acha pesado demais a solução de Deus para os problemas levantados por ele. Esperava uma solução mais leve do que ver seu povo sendo trucidado pelos babilônios. Mas reconhece que no final haveria justiça na sua reinvidicação.

Ninguém em sã consciência acha que o mundo terá algum jeito. Tudo está de mal a pior numa crescente decadência humana, moral, espiritual e material.

Famílias inteiras choram seus mortos, a perda de suas casas, seus objetos e a fome em muitos lugares é devastadora. Na africa, a cada 5 segundos morre uma criança de fome.

Os pais do Alexandre, um jovem de apenas 28 anos, o estão enterrando hoje em consequencia de um cancer devastador. Quem sabe devem estar se perguntado aos berros e em lágrimas onde está Deus? Por que um jovem engenheiro com uma vida longa pela frente, que poderia dar netos, dividir muitas alegrias e vitórias, está descendo a sepultura diante da estupidez da morte?

Tal como Habacuque eles também tem o direito de bradarem a Deus a sua dor. Podem perguntar a Deus até quando isso ainda será permitido.

Numa das respostas que Deus concede ao profeta ele diz que " o justo viverá pela fé ". A fé é a resposta para o absurdo e a falta de lógica humana. Por isso que a solução do mundo não será pelo caminho da lógica mas pelo absurdo de Deus. Há que se ter fé para sobreviver.

Habacuque nos dá uma lição de resignação no seu livro. Afronta Deus, discute com Deus, se impacienta com Deus mas o ouve. E num tom de humildade diz: " Eu me colocarei sobre a minha torre de vigia; ficarei sobre a fortaleza e vigiarei, para ver o que ele me dirá e o que terei como resposta à minha queixa." Habacuque 2: 2

Podemos não ter respostas para muitas coisas hoje. Podemos chorar com a nossa dor ou a dor alheia pelas situações que nos acometem. Mas creio que pela fé nada fica ou ficará sem resposta.

E concluo com as palavras de Habacuque quando Deus por fim respondeu as suas indignações: " Ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto nas videiras; ainda que o produto da oliveira falhe, e os campos não produzam mantimento; ainda que o rebanho seja exterminado do estábulo e não haja gado nos currais; mesmo assim, me alegrarei no Senhor, exultarei no Deus da minha salvação." Habacuque 3:17,18


Livingston Streck

sábado, 15 de janeiro de 2011

OS MORTOS DO RIO DE JANEIRO E O VESÚVIO DE POMPÉIA



Salvo engano, ano passado houve a tragédia de Angra dos Reis onde a chuva ceifou a vida de centenas de pessoas. Hoje os mortos estão na serra carioca onde já morreram por volta de 600 pessoas, tragédia esta considerada a pior de todos os tempos no país.

A tragédia que ora se repete ocorrerá provalvemente nas chuvas de janeiro do ano que vem. Novas mortes, novos deslizamentos e novos soterramentos. Isto tudo por que há um roteiro escrito da tragédia.

O descaso do poder público com as populações que vivem em áreas de risco, a falta de uma cultura de prevenção e evacuação da população antecipando-se às chuvas e possíveis deslizamentos, são os elementos necessários para o cenário trágico da dor.

Os vivos choram os seus mortos na tv. O espetáculo da barbárie se presta a alavancar audiência como a um Big Brother do terror.

A chuva torrencial que caiu no Rio de Janeiro me fez lembrar das cinzas do Vesúvio em Pompéia. O vulcão do Rio de Janeiro eclodiu do céu ao contrário de Pompéia.

No dia 24 de agosto de 79 d.C., os habitantes de Pompéia foram surprendidos quase que instantaneamente pelas cinzas do Vesúvio quando fugiam. Diz a historia que a maioria conseguiu escapar mas os que morreram ficaram petrificados.

Um relato interessante descoberto pelos arqueólogos diz que os habitantes que morreram ao tentar fugir, ficaram solidificados com os objetos nas mãos durante a fuga. Puseram os objetos em primeiro plano e suas vidas em segundo.

Os mortos do Rio de Janeiro temiam deixar suas casas e objetos. Levaram anos para adquirir suas coisas e não suportaram ter que deixar suas casas para salvarem suas vidas.

Há um Vesúvio invisivel que se esconde nas nuvens do nosso país. Cada ano uma Pompéia renasce nas serras, favelas e periferia das grandes cidades.

O que difere o Vesúvio de Pompéia com a serra do Rio de Janeiro é que os habitantes de Pompéia tinham conhecimento de que as lavas do vulcão estavam extintas. Não sabiam que corriam perigo.

A tragédia do Rio de Janeiro é recorrente. Sabe-se com um ano de antecedencia que pessoas irão morrer soterradas.

O nosso Vesúvio é feito de descaso político, abandono social e ocupação desordenada do solo.

Enquanto nos preparamos para o próximo carnaval as lavas da tragédia brasileira vão se recompondo para o próximo ano.

Livingston Streck

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

ABRAÃO, A FÉ E A LOUCURA

A história bíblica de Abraão é uma das mais contundentes para mim quando colocamos o relato dentro da esfera humana e pensamos na sua contemporaneidade.

Tudo em Abraão foge a lógica humana. Já em idade avançada, tanto ele como sua esposa Sara, conformam-se em não poder ter filhos pois Sara é estéril.

Mas eis que Deus, através da palavra, se manifesta a Abraão dizendo: " olha agora para o céu e conta as estrelas, se é que consegue contá-las; e acrescentou: Assim será a tua descendência." ( Gen. 15:5 )

Abraão se vê diante da loucura e da impossibilidade humana mas mesmo assim acabou acreditando na viabilidade da promessa.

O patriarca bíblico é conhecido como o pai da fé, o homem de sujeição incondicional que se permitiu ultrapassar toda a lógica humana.

Era a fé de Abraão um sentimento inerente a sua personalidade? Não, Abraão era lógico, racional e prático. A fé não lhe era muito conhecida. Abraão era fraco e mentiroso.

Dois episódios distintos comprovam a sua falta de fé e mentira. Quando Deus promete dar a ele uma descendência, era através de um filho seu gerado por sua mulher. Mas tanto Sara e Abraão não estavam certos de como esse filho viria em tão adiantada idade que resolveram a questão usando a sua serva que acabou lhe gerando um filho chamado Ismael.

Um segundo episódio aconteceu quando Abraão estava em viagem com sua família. Sua mulher, por ser tão bela, acabou sendo alvo do rei Abimeleque que a tomou para sí pois Abraão havia mentido dizendo que Sara era sua irmã pois temeu ser escravo do rei se tivesse dito que ela era sua mulher. ( Gen.20:2 )

Esta história de cunho contundente, nos mostra o processo de depuração do ser humano. É possível com este aprendizado, acreditar que se pode tirar o melhor do pior. Um homem fraco, sem fé e vacilante, recebe da história a alcunha de pai da fé.

Quando Deus pede que ele sacrifique seu único filho no monte Moriá, Abraão está depurado. Obedece com temor e tremor segundo as palavras do filosófo Sören Kierkegaard.

Abraão dá ao mundo a lição de que não há lógica na fé mas solução e mudança nos problemas humanos a despeito de nossa tão limitada racionalidade.

Livingston Streck

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

VIDA BREVE

Para que viemos ao mundo? Alguém já se perguntou por que nasceu? Qual o objetivo e qual propósito de estarmos vivendo e interagindo com nosso próximo?

A medida que vamos tomando consciencia do existir, construimos nossa realidade e nos propomos a adiar nosso fim através dos sonhos e desejos.

Elencamos uma lista de desejos e aos poucos vamos concretizando, construindo, nos aprimorando e sendo bem sucedidos nas lutas e realizações.

Alexandre também conquistou seus sonhos e desejos. Formou-se em engenharia quimica, estudou várias línguas, conheceu o mundo a trabalho e tinha uma fome enorme de viver e conquistar.

Até o dia em que sua voz apareceu afônica e o médico diagnosticou um estresse decorrente do trabalho.

Ledo engano. Diagnóstico errado. Após novos exames foi lhe detectado um cancêr no pulmão em metástase.

Alexandre tem apenas 28 anos de idade. Encontra-se na UTI e respira por aparelhos. Seu corpo luta intensamente pela vida mesmo em estado de coma. Resiste a morte a cada dia. A sua vontade de viver está tão impregnada em suas células que elas se recusam morrer e encerrar a vida.

Alexandre não sairá mais da UTI para a vida, para os seus sonhos e atribuições. Infelizmente sua vida está sendo concluida brevemente.

Filho único, deixará seus pais órfãos. Sua mãe não tem coragem de vê-lo na UTI. Não admite perder seu filho tão jovem. Fugir da realidade é onde ela busca forças para tornar a vida um mero pesadelo. Espera acordar e ver seu filho entrando pela porta sorridente.

A vida é silenciosa e guarda em cada um o seu segredo. Seu fim nunca é revelado. O que ela pede é que cada um valorize o seu momento. A consciencia de viver o seu melhor.

Para a morte não interessa mais o sorriso, a flor e o perdão.

Ernesto Sábato, escritor argentino diz em uma frase que: " a vida é tão curta e o ofício de viver tão dificil que, quando começamos a aprendê-lo, temos de morrer."

Realmente a vida é curta como disse Sábato, mas cabe nela uma centelha da eternidade.

Livingston Streck