sexta-feira, 11 de junho de 2010

Sobre a poetisa Mariana Ianelli


Conheci a minha amiga Mariana Ianelli em 1999 quando ela com 19 anos assombrou a crítica literária poética com seu primeiro livro “ Trajetória de antes.” Lia eu o jornal Folha de São Paulo à época quando deparei-me com um poema seu chamado “ Peça em um ato.”

“... Á margem
afundei em mim
feito um corpo sem força
e de mim não saí
para olhar as pessoas
para tocar coisas
ou tocar pessoas...”

A apresentação do livro foi feita pelo escritor Ignácio de Loyola Brandão que assim a descreveu:

“ Um olhar de pólvora, estranho mundo cheio de desespero, desencontro, buscas, repleto de sensualidade. Mariana torna sensual cada verso que toca, mesmo no trágico; na angústia, na agonia. Há nela inocência insana, ironia perplexa diante do abandono ( porque as pessoas se abandonam umas às outras ) (...). Textos delicados, porém corrosivos. Mariana conhece o valor de cada palavra, a síntese, ela sabe como transformar a palavra em estilete, cortando profundo (...).
E quando pensávamos: onde está a nova poesia brasileira, a que fale de pessoas e sentimentos? a que venha do fundo e não seja puro jogo verbal, visual, armadilhas, mas poesia de sangue e vísceras, aqui está Mariana, corajosamente à beira do ano 2000, buscando a trajetória do antes, enquanto todos querem a trajetória do depois, sem perceber que o depois não existem sem o antes.” Ignácio de Loyola Brandão

Destaco deste primeiro livro um poema lindíssimo que dá nome ao livro:

Trajetória de antes

Girando na bolha de sal
Eu falo contigo e te recebo
No tempo primário
Em que me ensinas o amor.
Um passo em falso
Me derruba e eu dissipo
Mas tu és boa
E me trazes devagar
Como quem segura um mundo.
Tua explosão irrompe
Tingida de fogo
E dói-te tão fundo
Que eu estremeço
E um amor de meses
Vaza todo, extravasa.
Desde que me conjugo
(eu sou, eu estou)
dou-te um nome de santa.
Viajo num estouro de luz
Que te queima, te arregaça.
Eu tenho o destino dos homens.
Fora de ti, quebrado o pacto,
Te encontro uma segunda vez.

M.I.

Tive o privilégio de ir hoje ( 10/06/2010 ) ao lançamento do seu 6º (sexto) livro chamado “ Treva Alvorada “ na Livraria da Vila, receber seu carinhoso abraço e prestigiá-la como seu fiel leitor ( fiel amigo como foram suas palavras ).

É sempre prazeroso um novo livro desta tão importante poetisa que a cada livro seu, nos brinda com sua profunda e enigmática poesia, mesclando lirismo, dor, esperança, transcendência, contradições como contraditório é o homem na sua essência.

Ainda sorvendo os poemas iniciais do livro destaco Pietá que já me toca profundamente:

Pietá

Por delicadeza
Devia cada um resolver seu vestígio,
Não deixar o corpo a esmo,
Atravessado na passagem,
Sem desejo, sem enigma.

Mas se me fica o teu corpo
Eu te arrepanho nos braços
Com a maternidade do ofício
E lavo os teus ombros
De quanto pesou sobre eles,
O teu sexo, que a nenhum afago responde,
Lavo os teus pés, o ato mais santo.

Eu te arremato, eu te limpo da vida,
Faço com que desapareças,
Que o teu equívoco me abasteça
Da razão dos humildes.

Fardo ensoalhado, esse,
De amparar o meu próprio destino.

M.I
Este poema há de tocar todos aqueles que em algum momento tiveram também que limpar da vida os inertes sem enigma.

Parabéns Mariana Ianelli e que seja longa sua trajetória e sua missão de transformar sentimentos em palavras e que a dor pungente seja sempre atenuada pelo lirismo e por este olhar tão perscrutador.


Livingston Streck


Alguns poemas são recitados pela própria autora no site:
http://www2.uol.com.br/marianaianelli/

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