sexta-feira, 10 de julho de 2009

A hora inútil

Neste momento da minha vida em que estou, segundo o Instituto Nacional de Seguridade Social ( INSS ), gozando de um período de incapacidade laborativa, portanto longe das responsabilidades da minha rotina, tenho observado e vivido algumas situações que num dia a dia não é possível presenciar.

Sentado à mesa passando o olho em alguns papéis, livros e revistas em busca de algo que pudesse me absorver e captar minha concentração, deparei-me com o relógio marcando catorze horas e cinqüenta e cinco minutos. Fiquei observando o passar do tempo durante os cinco minutos seguintes quando enfim o relógio bateu as quinze horas em ponto.

Parei de fazer qualquer coisa neste momento e fixei-me neste horário cravado no relógio de parede. O que se pode fazer exatamente as quinze horas de um dia? Almocei três horas atrás, acompanhei os noticiários da TV, informei-me das barbaridades cotidianas como prato de sobremesa. Vou fazer meu lanche três ou quatro horas depois das quinze horas provavelmente vendo as mesmas barbaridades repetidas do meio dia pois a sociedade precisa ser martelada todos os dias com estas informações. Este circo de horror precisa estar no inconsciente coletivo como a um vicio afim de atender os reclamos do mercado que tem a mídia como o mais fiel colaborador.

Mas na realidade quero mesmo é falar deste horário marcado no meu relógio. Se estivesse na minha lide diária, no meu trabalho, não prestaria atenção neste horário. Estaria envolto em problemas, falando com algum cliente, cobrando alguma entrega que deveria ter chegado, atendendo o gerente do banco, etc. Mas não. Estou laborativamente incapacitado. Estou momentaneamente inutilizado pelos fatos da vida. E esta incapacitação me propicia ao encontro da hora inútil.

Como é inútil este horário. Distante das coisas boas e ruins do dia. Presumo que neste horário nem se mata e nem se morre. Percebo também que os conflitos, os assaltos e os acidentes se dão no começo da noite. A televisão tem farta matéria prima para vender seus produtos a custa do sangue dos desvalidos, bandidos e inocentes por volta das dezenove horas. Mas as quinze horas, que hora inútil. Tenho a impressão de que nem o ar circula neste horário. A tarde espreguiça-se sobre si mesma numa letargia total.

Alguns autores já trataram determinadas horas de forma folclórica. Rubem Braga em uma de suas crônicas dizia que a meia noite era a hora do capeta. Folclores a parte o que posso afirmar é que senti na pele as quinze horas. A hora inútil.

Livingston Streck

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